O Governo do Reino Unido pretende discutir em Setembro a adesão de Angola à Commonwealth, durante a prevista visita a Luanda da enviada especial ao país da primeira-ministra Theresa May, anunciou Lindsay Northover.
A pretensão de adesão à Commonwealth foi manifestada em Junho, pelo Presidente angolano, João Lourenço, e em Setembro está prevista nova visita de Lindsay Northover a Luanda, como a própria anunciou num artigo de opinião, publicado no Jornal de Angola.
“Acolho com muita satisfação o interesse de Angola em aderir à Commonwealth e espero que o assunto seja um tópico de conversação relevante durante a minha próxima visita, em Setembro. Em três anos esta será a minha oitava visita a Angola no cargo de Enviada da primeira-ministra britânica para o Comércio com Angola”, lê-se no artigo de opinião, ontem publicado no órgão oficioso do regime do MPLA.
“O objectivo da minha visita será, conforme as anteriores, promover uma maior cooperação empresarial entre Angola e o Reino Unido. Porém, desta vez o foco será no sector agrícola de Angola”, acrescentou a baronesa Lindsay Northover.
Durante a visita oficial que realizou a Paris no final de Maio, João Lourenço manifestou, no Palácio do Eliseu, também o interesse de Angola em ser membro da Organização Internacional da Francofonia e recebeu o apoio do seu homólogo francês, Emmanuel Macron.
Dias depois, a 1 de Junho, o Presidente angolano acrescentou que pode seguir-se um pedido idêntico para a Commonwealth, comunidade que junta os países anglófonos.
“A exemplo do que se passa com Moçambique, que está ali encravado entre países anglófonos (…) e acabou por aderir à Commonwealth, também Angola está cercada, não por países lusófonos, mas por países francófonos e anglófonos. Portanto, não se admirem que estejamos a pedir agora a adesão à francofonia e que daqui a uns dias estejamos a pedir também a adesão à Commonwealth”, apontou João Lourenço.
No artigo publicado no Jornal de Angola, Lindsay Northover recorda que a Commonwealth é uma “associação voluntária de 53 estados soberanos, independentes e iguais”, com 2.400 milhões de pessoas “e que inclui tanto economias desenvolvidas como países em desenvolvimento”.
“Os países da Commonwealth têm um grande desempenho e compõem sete dos 10 principais países do Índice Ibrahim de Governança Africana; os custos bilaterais para as trocas comerciais são em média 19% mais baixos para os países da Commonwealth do que para os países não-membros; e na África Subsaariana, os países da Commonwealth compõem sete dos 10 países com melhor desempenho em igualdade de género”, aponta Lindsay Northover, no mesmo artigo.
Recorda que, “assim como Angola”, os dois últimos países que se juntaram à Commonwealth, Ruanda e Moçambique, “não têm laços históricos com o Império Britânico”.
Segundo Lindsay Northover, a Agência do Reino Unido para o Financiamento de Exportações (UKEF) tem actualmente uma disponibilidade de até 750 milhões de libras esterlinas (850 milhões de euros) para apoiar projectos em Angola.
E essa aberração chamada CPLP?
No mundo lusófono existe uma “coisa” com vinte e tal anos de idade e de inoperacionalidade. Chama-se CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e nada mais é, hoje, do que um elefante branco.
A CPLP, sobretudo devido ao incremento (ou será excremento?) dado pela Guiné… Equatorial, tem estado na ribalta mais uma vez porque João Lourenço resolveu, de forma indirecta, dizer que ela não passa – apesar da idade – de um nado-morto.
Segundo o saudoso Vasco Graça Moura, na altura presidente do Conselho de Administração da Fundação Centro Cultural de Belém, “a CPLP é uma espécie de fantasma que não serve para rigorosamente nada, que só serve para empatar e ocupar gente desocupada”.
Seja como for, a CPLP tem uma esplendorosa sede no Palácio Conde Penafiel, na zona do Largo do Caldas, na baixa de Lisboa, que inclui auditório, biblioteca e centro de documentação, além de salas de reuniões, gabinetes de trabalho e um salão nobre. A embalagem é excelente. O conteúdo, contudo, continua a ser uma farsa. Farsa, ainda por cima, de muito fraca qualidade.
“Fica facilitada a nossa intenção de promover um contacto mais directo com a comunidade”, disse na altura da inauguração da sede, em Fevereiro de 2012, o então secretário-executivo da organização, Domingos Simões Pereira, adiantando que a ideia era atrair a comunidade académica e promover encontros com as várias comunidades lusófonas que vivem em Portugal.
“Este conjunto de movimentos deverá permitir que a CPLP seja mais conhecida e esteja mais presente no dia-a-dia dos cidadãos”, considerou, lembrando que as anteriores instalações, na Lapa, não ofereciam condições para estas iniciativas.
Ao longo dos anos, a CPLP, criada a 17 de Julho de 1996, pretendeu (embora sem êxito) afirmar-se como organização de concertação politico-diplomática e de cooperação, sendo frequentemente criticada por não conseguir chegar às sociedades dos oito países. Aliás, raramente consegue ir mais além do umbigo dos seus idílicos, líricos e eventualmente etílicos mentores.
“Gostávamos de ter ido bastante mais rápido, mas (…) era preciso estruturar a organização, era preciso que fosse reconhecida nos espaços oficiais para que hoje possamos sentir que temos oportunidade de nos aproximarmos da comunidade”, disse na altura Domingos Simões Pereira.
E sendo a CPLP uma Comunidade dos Países de diversas Línguas, entre as quais a Portuguesa, não admira que um dia destes Timor-Leste abandone mesmo o português, outros queiram entrar, mesmo que o que pensem da nossa Pátria comum (a língua) seja igual a zero.
Nada como a CPLP estar preocupada, por exemplo, em ajudar os cidadãos ucranianos e esquecer – como tem feito até agora – os guineenses. É, aliás, simpático dar sapatos aos filhos do vizinho enquanto os nossos andam descalços…
“Mas quando nós começamos a receber esta atenção e este nível de interesse por parte de países que à priori não pareceria terem afinidades, interesses tão óbvios, isso deve alertar-nos para aquilo que a CPLP pode significar, para aquilo que pode representar”, acrescentou na altura Domingos Simões Pereira.
E pelo que a CPLP quer de facto representar, seria mais aconselhável mudar o nome para Comunidade dos Países de Língua Petrolífera. Esquecia-se a língua portuguesa, que é coisa de somenos importância, e apostava-se forte naquilo que faz mover os areópagos da política internacional: o petróleo.
Aliás, mesmo sem perguntar a Xanana Gusmão, todos sabem que a Indonésia é um daqueles países a quem a lusofonia tudo deve, mormente Timor-Leste.
Por alguma razão Jacarta proibiu, enquanto foi dona de Timor-Leste, aquilo que foi, ou é, desejo de Xanana Gusmão, ou seja, o uso da língua portuguesa.
Prioridade das prioridades é para a CPLP o Acordo Ortográfico. Tão ou mais prioritário quando se sabe que a Guiné-Bissau e Angola registam das mais altas taxas de mortalidade infantil no mundo.
Será que algum dia a CPLP se preocupará como facto de a esperança de vida à nascença dos guineense ser apenas de 45 anos?
Será que algum dia a CPLP se preocupará como facto de os líderes angolanos continuarem a saborear várias refeições por dia, esquecendo que na mesma rua há gente a morrer à fome?
Será que algum dia a CPLP se preocupará como facto de a comunidade internacional continuar a mandar (em sentido figurado) toneladas de peixe para Moçambique, esquecendo que o que os moçambicanos precisam é tão só de quem os ensine a pescar?
Será que algum dia a CPLP se preocupará como facto de se mandar montes de antibióticos para a Guiné-Bissau, esquecendo, sobretudo porque tem a barriga cheia, que esses medicamentos só devem ser tomados depois de uma coisa essencial que os guineenses não têm: refeições?
A CPLP diz que Angola desenvolveu nos últimos anos um grande esforço para “acentuar a coesão” entre os membros do bloco lusófono nas áreas da democracia, direitos humanos e reforço do estado de direito. O paradigma de tudo isso será com certeza a Guiné Equatorial.
Democracia? Direitos humanos? Estado de direito? Será que a CPLP sabe mesmo quais são os estados que fazem parte da Comunidade de Países (também) de Língua Portuguesa?
Ou, sabendo-o, considera que Angola é um exemplo de democracia, quando 70% dos angolanos vive na miséria e vota com a barriga… vazia?
Saberá a CPLP que, há muitos anos, a Human Rights Watch revela que Angola enfrenta problemas de desrespeito pelos direitos humanos, incluindo a falta de liberdade de expressão, a tortura e a violência?
O caso da Guiné Equatorial
Embora seja uma ditadura, a Guiné Equatorial é membro da CPLP. Tudo normal.
Domingos Simões Pereira explicava na altura da adesão que, “por um lado, a Guiné Equatorial já está cumprindo com a aprovação da língua portuguesa, como língua oficial. Mas também há princípios que têm a ver com o exercício democrático no país, com uma maior abertura, com os direitos humanos. Há todo um conjunto de princípios no país que nós achamos que têm que ser respeitados”.
Por aqui se vê como a língua portuguesa é complicada. Para a CPLP democracia e direitos humanos têm um significado diferente, ou até antagónico, daquele que nos é ensinado pelos dicionários.
Assim, com a bênção do democrata (apesar de não eleito nominalmente e no poder desde 1979) então presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, e com o agachamento dos restantes países, a Guiné Equatorial comprou o seu lugar na CPLP.
É evidente que a entrada da Guiné Equatorial na CPLP “não vai mudar nada o regime de Teodoro Obiang” (onde está a novidade?), afirmava já em Julho de 2010 um dos líderes da oposição em Malabo.
“Obiang está no poder desde 1979 e vai continuar a violar os direitos humanos, a torturar e a prender”, declarou Celestino Bacalle, vice-secretário geral da Convergência para a Democracia Social (CPDS).
“Nada mudou na ditadura nestes anos todos nem vai mudar com a entrada na CPLP. Quem muda são os que antes criticavam a situação na Guiné Equatorial e agora são convencidos pelo dinheiro, pelo petróleo e pelos negócios”, acusou então o número dois da maior plataforma da oposição equato-guineense.
“Hoje, os que tinham uma posição crítica sobre a ditadura de Obiang mudam de posição depois de visitarem Malabo”, ironizou o dirigente da oposição, responsável pelas relações políticas internacionais da CPDS.
“A adesão à CPLP não nos surpreende. Está na linha do que Obiang tem feito com outras organizações internacionais. Ele quer mostrar ao povo guineense que o dinheiro pode comprar tudo o que ele quiser. O pior é que tem razão”, denunciou o dirigente da CPDS.
Atente-se no que afirmava o moçambicano Tomaz Salomão, na altura secretário executivo da SADC (Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral): “São ditadores, mas pronto, paciência… são as pessoas que estão lá. E os critérios da liderança da organização não obrigam à realização de eleições democráticas”.
A melhor prenda que poderiam dar à Lusofonia era a notícia de que, finalmente, esta CPLP seria extinta. Não vai acontecer, é claro. Continua a haver muita gente que precisa de ganhar bem e nada fazer. E nisso esta CPLP é exímia.